SINOPSE – “Vitória”: quando a imagem se torna a força da justiça

SINOPSE é uma coluna do Jornal Primeira Página assinada por Carolinne Macedo. Tudo sobre os principais lançamentos cinematográficos do mês e um mergulho na sétima arte!

Fernanda Montenegro é um monumento do cinema brasileiro, e Andrucha Waddington sabe disso. Em “Vitória”, o diretor trata a atriz como uma entidade cinematográfica, transformando cada enquadramento em um estudo de sua expressão e presença. O longa, que inicialmente estava nas mãos de Breno Silveira antes de sua morte, carrega essa mudança em sua essência. O que poderia ser um thriller político denso e tenso se molda, na verdade, em um melodrama envolvente, onde a justiça se mistura à obstinação de uma mulher que se recusa a se calar diante da violência. Andrucha que já entregou histórias onde suas habilidades foram comprovadas, como em “Gêmeas” e “Eu, Tu, Eles”, além da série “Sob Pressão”, retorna agora ao cinema com a mesma capacidade de extrair textura e complexidade das relações humanas que já conhecíamos.

A história segue Dona Nina, uma mulher que decide registrar, da janela de seu apartamento, o crime organizado que toma conta de sua vizinhança. Um filme sobre a imagem enquanto agente de manutenção da sociedade. Aqui, o medo não se traduz na iminência do perigo, mas sim na impotência de uma sociedade anestesiada pela corrupção. O diretor constrói seu filme mais sobre a observação do que sobre a ação. O perigo está lá, mas quase nunca se concretiza. A fotografia reforça essa atmosfera, preenchendo a tela com tons acinzentados, quase esgotando qualquer vestígio de beleza do cenário carioca. Montenegro sempre parece envolta em uma realidade pouco convidativa, que se transforma em aflição crescente e Copacabana surge como uma paisagem melancólica, onde o turístico se dissolve na decadência.

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Essa escolha estilística é reforçada pela direção de arte, que transforma o apartamento de Nina em um espaço solitário e claustrofóbico, um reflexo de sua luta isolada. A obra investiga a solidão dessa personagem através da solidão do seu espaço, em uma direção de arte assombrosa. A maneira como é filmada, à esgueira pelas ruas da delegacia ou por trás da persiana encardida, tudo isso esvazia a vida ao redor de Nina. Mas apesar da força visual, o filme tropeça em sua necessidade de justificar a todo momento o posicionamento de sua protagonista. Além disso, o roteiro, por vezes, soa fragmentado, com momentos que mais lembram cenas soltas de um trailer do que uma progressão fluida. Por mais que a história indique que Nina corre risco de vida, raramente sentimos essa ameaça de forma palpável. A tensão existe mais no discurso do que na própria mise-en-scène.

Ainda assim, “Vitória” é um filme que se sustenta pela força de sua protagonista. Fernanda Montenegro domina cada cena com uma intensidade avassaladora, elevando o material com sua presença magnética. A câmera a acompanha com admiração quase reverente, captando cada gesto, cada olhar, cada silêncio carregado de significado explora a indignação e força de vontade de uma mulher que enfrentou o sistema em busca de justiça. Mais do que uma obra sobre moral, “Vitória” é um testamento ao poder da imagem e ao legado de uma atriz que, aos 95 anos, continua a redefinir os limites do cinema brasileiro. “Vitória” nos ensina que, independentemente da situação, devemos lutar pelo que acreditamos. Não importa a idade nem os riscos envolvidos: a decisão certa precisa ser tomada.

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