SINOPSE é a coluna do Jornal Primeira Página assinada por Carolinne Macedo. Tudo sobre os principais lançamentos cinematográficos do mês e um mergulho na sétima arte!
Que Denis Villeneuve não brinca em serviço, disso já sabíamos. Mas o retorno do diretor ao universo de Duna é uma experiência visual ainda mais apoteótica, um espetáculo cinematográfico que abraça a grandiosidade sem hesitar. “Duna: Parte Dois” é uma imersão em um mundo vasto e opressor, onde cada grão de areia parece meticulosamente posicionado para reforçar o épico. Mas, como na primeira parte, a beleza das imagens se esforça demais para preencher o vazio emocional do roteiro. O resultado é uma obra de escala monumental, que seduz pela forma, mas que de forma alguma me convence pelo conteúdo. Se anteriormente já haviam sinais de que se priorizaria a estética ao invés da narrativa, esta sequência confirma a escolha. O cineasta abre mão de um equilíbrio entre os dramas internos dos personagens e o espetáculo visual, optando por engrandecer a jornada messiânica do protagonista sem permitir que seu dilema existencial se aprofunde.
A câmera se encanta com o deserto de Arrakis, com a dança das naves e o balé das explosões, mas esquece de nos aproximar dos conflitos humanos que movem essa trama. O filme opera em dois registros que, ironicamente, pouco dialogam entre si: o épico grandioso, marcado por planos abertos que evidenciam a vastidão de Arrakis e o peso da guerra, e o drama de câmara, com personagens enquadrados em closes e planos médios que enfatizam suas expressões, mas sem situá-los de maneira convincente no universo ao redor. A escolha de Villeneuve pelo gigantismo é clara, e sua aposta no impacto visual funciona até certo ponto. A questão é que, quando a poeira baixa, sobra uma sensação de distanciamento, como se estivéssemos observando uma bela pintura, mas sem conseguir nos conectar emocionalmente a ela.
Hans Zimmer, mais uma vez se faz presente com uma trilha hipnótica. Suas composições tentam inspirar emoção onde o roteiro hesita em adentrar, criando momentos de pura imersão sensorial. No entanto, é como se a música precisasse constantemente nos lembrar da grandiosidade do que estamos vendo. O épico se sustenta, mas à custa de uma dramaticidade que soa forçada em alguns momentos. A construção de mundo é, sem dúvida, um dos pontos altos do longa, há um cuidado minucioso com os detalhes da cultura fremen, com o idioma, os rituais e a estética desse povo oprimido. Mas, em vez de permitir que esses elementos orgânicos se desenvolvam de maneira natural, o filme os exibe quase como um portfólio de design de produção. O desfile de figurantes e personagens em closes dramáticos, embora impressionante, parece mais uma vitrine de diversidade étnica do que um mergulho genuíno na complexidade desse universo.
No campo das atuações, Timothée Chalamet entrega uma performance sólida, mas contida. Seu Paul Atreides cresce em presença, mas ainda carrega certa frieza, como se o ator não conseguisse se desvencilhar totalmente de sua persona para abraçar o peso do personagem. Zendaya, por sua vez, ganha mais espaço como Chani, tornando-se um contraponto necessário à jornada de Paul. Seu olhar cético e sua resistência à transformação messiânica do protagonista trazem uma camada interessante à narrativa. No entanto, é Javier Bardem quem realmente brilha como Stilgar. Seu personagem transborda carisma e intensidade, tornando-se a alma do filme. Quando ele está em cena, há uma energia palpável, um senso de urgência que falta ao restante da obra. O antagonista Feyd-Rautha, interpretado por Austin Butler, finalmente entra em cena e com um magnetismo perturbador, cria um vilão ameaçador e sedutor ao mesmo tempo, fugindo do clichê do mero psicopata caricato.
Apesar de tamanha imponência, “Duna: Parte” Dois tropeça na condução de seu ritmo. Se a primeira parte foi criticada por parecer um extenso prólogo, esta sequência, embora mais dinâmica, ainda carrega momentos de arrasto narrativo. A guerra santa, que deveria ser o clímax emocional da história, carece de impacto real, com transições abruptas que enfraquecem a construção de tensão. E a intriga política se dilui em meio ao espetáculo visual, perdendo a densidade que poderia torná-la realmente envolvente. No fim das contas, é um triunfo técnico inegável, mas um épico que carece de alma. Há um fascínio inegável em retornar a Arrakis, mas também a sensação de que estamos apenas vislumbrando a superfície de um universo muito mais rico do que aquilo que nos é permitido sentir.
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