Nova Lei Maria da Penha quer proteção imediata para vítimas
Morta na própria cama – Priscila Lopes Ferreira não verá os dois filhos crescerem. Aos 32 anos ela foi morta em um crime brutal. O assassinato de Priscila foi no Jardim Aureny, na casa onde ela vivia com a família.
A perícia preliminar apontou que ela tentou se defender do ataque, mas não foi suficiente para escapar do feminicídio. Priscila recebeu ao menos sete facadas e morreu na própria cama.
O marido, José Rodrigues Lopes é o principal suspeito. Após o crime ele fugiu, só prestou depoimento à polícia após passar o flagrante. Foi só após um mandado de prisão preventiva ser expedido pela Vara Criminal de Palmas durante a “Operação Malus”, deflagrada pela 1ª DHPP, que ele foi preso.
Pedido Inusitado – Foi usando um código que uma mulher conseguiu ajuda ao ser vítima de violência doméstica. O caso aconteceu em Araguaína, em uma ligação para o Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (SAMU), a mulher pediu uma pizza para a atendente.
Veja como foi a conversa:
- Samu: Samu, boa noite!
- Vítima: A pizza que eu pedi aqui vai demorar muito?
- Samu: aqui é do Samu, senhora.
- Vítima: Sim, você sabe me dizer quantos minutos vai demorar para chegar porque estou agoniada. Meus filhos estão com fome, minhas duas crianças pequenas estão com fome. Vai demorar muito?
- Samu: Você quer que mande a polícia até aí?
- Vítima: sim, quero sim. O mais rápido possível porque estou esperando faz horas e meus filhos estão agoniados aqui.
Pedir pizza, açaí e hambúrguer em ligações para centrais de ajuda é uma maneira de informar que episódios de violência estão acontecendo, sem o agressor perceber. Mesmo assim, esse tipo de abordagem passará a fazer partes dos próximos treinamentos das equipes do SAMU.
“Não é algo convencional, mas os casos começam a ficar cada vez mais comuns no país, por isso vamos preparar nossa equipe para ficar cada vez mais sensível para chamados dessa natureza”, informou o diretor administrativo do SAMU, Alberto Gomes.
Foi graças a essa ligação que a polícia encontrou a vítima e prendeu o companheiro dela, um homem de 43 anos que foi indiciado por lesão corporal qualificada e injúria qualificada, em contexto de violência doméstica.
Casa queimada – Uma mulher que vive na 1.206 sul teve a casa incendiada e o principal suspeito é o ex-marido. O incêndio foi registrado na última quinta-feira, 30. Há poucos dias, ela foi até a Central de Atendimento à Mulher registrar um boletim de ocorrência, relatando ameaças do ex. O suspeito chegou a ser preso por violência doméstica, mas foi solto durante uma audiência de custódia.
Após ser solto, novas ameaçam teriam sido feitas, em um dos episódios o homem disse que iria queimar a ex-companheira. Ela saiu de casa e quando voltou encontrou a casa incendiada, com tudo destruído.
Em todo o Tocantins, de 1º de janeiro até o dia 29 de março de 2023 foram registrados 2.990 crimes contra mulheres. As principais ocorrências estão relacionadas a ameaça (978 casos), lesão corporal (540) e injúria (482).
“Esses números podem ser ainda maiores. A Secretaria de Segurança Pública (SSP) contabiliza apenas quando existe um registro por parte da vítima e infelizmente ainda existe uma grande subnotificação. Existe o medo, o receio de denunciar o companheiro. Em alguns casos, quando a violência não é física, a mulher acaba nem percebendo que é uma vítima”, afirma a advogada Bruna Vasconcelos.
No estado, Palmas é a cidade com mais casos de crimes contra mulheres. Foram 770 registros nos três primeiros meses de 2023. Araguaína, Porto Nacional e Gurupi também apresentam altos índices desses crimes.
Segundo a Secretaria de Estado de Saúde (SES) as mulheres vítimas de violência são atendidas por meio das unidades hospitalares nos Serviços de Atenção Especializada às Pessoas em Situação de Violência Sexual (SAVIS), localizados em Palmas, Porto Nacional, Augustinópolis e Gurupi.
Conforme dados dos SAVIS, foram realizados 1.132 atendimentos em 2022, sendo: 287, no Hospital e Maternidade Dona Regina Siqueira Campos (HMDR); 250, no Hospital Materno Infantil Tia Dedé (HMITD); 93, no Hospital Regional de Augustinópolis (HRAUG) e 502, no Hospital Regional de Gurupi (HRG). Em 2023 (janeiro e fevereiro), os números chegam a 178, sendo 42, no HMDR; 26, no HMITD; 20, no HRAUG e 90, no HRG.
O que vai mudar com a nova legislação?
Um dos principais instrumentos na luta contra a violência doméstica no Brasil é a Lei Maria da Penha, que foi sancionada em agosto de 2006. A legislação tem passado por evoluções ao longo desses 17 anos. Na semana passada, após o Senado analisar, a Câmara dos Deputados aprovou mudanças para dar mais agilidade na proteção das mulheres vítimas de violência.
O projeto aprovado é de autoria de Simone Tebet, na época senadora da república e atualmente ministra do Planejamento. Com as mudanças, as medidas protetivas devem ser concedidas no momento em que a mulher faz a denúncia na polícia.
Outra mudança é que a proteção deve ser garantida mesmo sem o registro de um boletim de ocorrência, um inquérito policial, alguma ação na justiça. Segundo a ministra a lei vai combater a burocracia exigida atualmente para que a mulher fique protegida em situações de violência.
“Exige-se a correspondência criminal dos atos de violência doméstica e familiar; exige-se prova cabal de crime, em vez de se respaldar a narrativa da mulher, valendo lembrar que tratamos, aqui, de medidas de proteção, e não de sanções penais”, informou Simone Tebet.
A proposta também passa a categorizar como violência contra a mulher toda a situação de violência doméstica e familiar. “Isso significa que, a lei Maria da Penha será aplicada em todas as situações, não será mais valorizado a causa, motivação dos atos de violência”, afirma a advogada Bruna Vasconcelos.
Com a nova lei, as medidas protetivas devem se estender enquanto houver ameaça à integridade física, psicológica, sexual, patrimonial ou moral da vítima.
Você é vítima de violência doméstica? Denuncie!
Ao redor do mundo, alguns gestos simples e discretos são suficientes para denunciar uma situação de agressão ou abuso contra a mulher. Um deles é abrir a palma da mão, colocar o polegar abaixo dos outros dedos e fechar a mão, escondendo o polegar.
Outra opção é a Campanha Sinal Vermelho criada pelo CNJ (Conselho Nacional de Justiça) e pela AMB (Associação dos Magistrados Brasileiros), que consiste em fazer um sinal vermelho na palma da mão e pedir ajuda em órgãos públicos, agências bancárias e farmácias, por exemplo.
Para fazer denúncias, a orientação principal é entrar em contato com a Polícia Militar no 190. É indicado também formalizar a denúncia na Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher, da Polícia Civil. E o Governo Federal criou a Central de Atendimento à Mulher no número 180, que registra e encaminha os casos aos órgãos competentes.
O Tocantins também desenvolveu o aplicativo “Salve Mulher” que tem cobertura nos 139 municípios e é uma ferramenta que funciona 24 horas, todos os dias da semana. No app, a vítima de violência pode registrar boletim de ocorrência e solicitar medida protetiva.
Para o secretário de Segurança Pública Wlademir Costa, o aplicativo é mais um elo na rede de proteção às vítimas de violência doméstica. “Agora praticamente a delegacia está indo até a vítima, colocando à disposição para que ela possa registrar sua denúncia, seja de forma anônima, seja de forma representativa, para que possa chegar ao conhecimento de todas as autoridades”, destacou.
O aplicativo é gratuito e pode ser baixado nos celulares com sistema operacional IOS e Android.