SINOPSE – A força transformadora da solidariedade no último filme de Ken Loach

SINOPSE é a nova coluna do Jornal Primeira Página assinada por Carolinne Macedo. Tudo sobre os principais lançamentos cinematográficos do mês e um mergulho na sétima arte!

“The Old Oak” é um verdadeiro hino à solidariedade e à resiliência humana, e destaca-se como uma das criações mais emotivas e esperançosas de Ken Loach. Aclamado no Festival de Cannes do ano passado, o filme completa a trilogia do cineasta, cujos cenários se centram no nordeste de Inglaterra. Já conhecido por suas obras sensíveis e socialmente engajadas como “Ventos da Liberdade” e “Eu, Daniel Blake”, este, que pode ser o último longa-metragem do cineasta britânico, tem estreia prevista para 8 de agosto no Brasil.

Nos últimos anos, em todo o mundo, a questão da xenofobia ganhou as manchetes graças ao êxodo em massa de diferentes nacionalidades. Este fenômeno social tem levantado grandes questões em relação ao ser humano e como esse problema se desenvolve em diferentes contextos. Fiel a si próprio e ao seu já consolidado e antigo posicionamento político-ideológico a favor de causas e projetos de intervenção social, o cineasta regressa em “The Old Oak” aos ambientes degradados da classe operária, incidindo desta vez numa história de confronto entre alguns habitantes de uma comunidade mineira do Noroeste da Inglaterra e um grupo de refugiados sírios que se instala nas casas que lhes foram destinadas pelas autoridades britânicas.

A trama se desenrola no pub “The Old Oak”, que serve como ponto de encontro para os habitantes locais e imigrantes sírios que chegam em busca de um recomeço. Este cenário é habilmente utilizado por Loach para explorar a dinâmica entre os locais e os recém-chegados, numa abordagem que combina realismo social com uma profunda análise das relações humanas. O filme é uma representação vívida do poder transformador do contato humano, que ganha ainda mais relevância em tempos onde o preconceito e a intolerância parecem dominar o discurso global.

O roteiro, escrito por Paul Laverty, é mais didático do que deveria, mas isso de maneira alguma diminui sua eficácia. Laverty opta por um diálogo que fala diretamente ao coração do público, sem recorrer a artifícios literários desnecessários. Sua habilidade em criar personagens com os quais o público pode se identificar é notável. O suspense criado pela expectativa do confronto é substituído por uma surpresa que nos lembra da capacidade humana para a gentileza e o perdão. Laverty demonstra, através de momentos comoventes, que a comunicação direta e compreensiva pode ser mais poderosa do que qualquer metáfora.

Ken Loach surpreende ao adotar uma abordagem mais otimista, algo que raramente vemos em seus trabalhos. Este otimismo é exemplificado na relação entre TJ Ballantyne, o proprietário do pub, e Yara. Enquanto o personagem de TJ reflete sobre suas experiências passadas e a transformação de sua comunidade, Yara enxerga o mundo através de uma lente de esperança. Suas palavras – “Quando olho pela câmera fotográfica, eu escolho enxergar o mundo com esperança” – ressoam como um mantra que permeia toda a narrativa. Esta abordagem não diminui o impacto das críticas sociais presentes no filme, mas oferece uma nova perspectiva sobre como o mundo pode ser, se escolhermos a esperança em vez do desespero.

Um dos pontos altos do longa-metragem é a forma como o diretor aborda o conceito de lar. Tanto os imigrantes sírios quanto os moradores locais estão em busca de um lugar onde possam se sentir seguros e acolhidos. Essa busca é apresentada de maneira tocante e verossímil, através de cenas que mostram pequenos gestos de solidariedade e bondade, que eventualmente criam laços mais fortes do que qualquer preconceito. A parceria entre Loach e Laverty resulta em um filme que, embora revele as injustiças e desigualdades do mundo, também sugere que a arte pode ser um catalisador para a transformação social.

“The Old Oak” é uma obra que transcende as barreiras do cinema e convida o público a refletir sobre a importância da comunidade e da empatia. O longa é uma manifestação visual e auditiva de cidadania solidária, que nos deixa com uma mensagem poderosa e memorável: a esperança pode ser o fio condutor que une comunidades e derruba barreiras. Ken Loach, em mais uma de suas obras-primas, nos lembra de que, mesmo em um mundo aparentemente incorrigível, a arte tem o poder de nos abraçar e convidar a um futuro mais inclusivo e plural. Este filme não só merece cinco estrelas, mas é um lembrete constante de que, no final das contas, todos estamos buscando o mesmo: um lugar que possamos chamar de lar.

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