Palmas completa 36 anos com mais de 24 mil idosos e desafios na rede de atenção à terceira idade

Ao completar 36 anos nesta terça-feira, 20 de maio, Palmas revela um desafio crescente: garantir uma rede de atenção adequada à sua população idosa, que já ultrapassa 24,9 mil pessoas. Embora conte com mais de 80 setores de atendimento voltados a esse público, a capital enfrenta desequilíbrios na oferta de serviços — com forte concentração na saúde e carência nas áreas de defesa, segurança, justiça e educação, essenciais para a proteção integral e o protagonismo da terceira idade. Casos recorrentes de violência também evidenciam as fragilidades na rede de proteção.

Ao longo da semana do aniversário da cidade, o Jornal Primeira Página aborda a realidade da terceira idade na capital, com base em dados, depoimentos e uma análise da estrutura de atendimento voltada a esse público. Acesse os links abaixo:

Segundo o Censo de 2022 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), Palmas tem 24.916 pessoas com 60 anos ou mais. No estado do Tocantins, o número é de 184.099 idosos, o que representa 12,2% dos 1.511.459 habitantes. Em nível nacional, o Ministério da Saúde estima que o Brasil terá cerca de dois bilhões de pessoas idosas até 2050, tornando-se a quinta maior população idosa do mundo.

Apesar do crescimento, Palmas não está entre os municípios com maior índice de envelhecimento. Esse índice é calculado pela razão entre a população com 60 anos ou mais e a população de 0 a 14 anos. Araguaçu lidera com um índice de 71,8, enquanto Tocantínia registra o menor valor, com 19,4. Palmas ocupa a quinta posição entre os municípios com menor índice de envelhecimento, com 23,4.

O índice de envelhecimento é a razão entre o número de pessoas com 60 anos ou mais e o número de pessoas com menos de 15 anos, em determinada população e período. Esse indicador mede os extremos etários da população e, quanto mais elevado, mais avançado está o estágio da transição demográfica.

Sobre a rede de atendimento à pessoa idosa

Uma pesquisa realizada em 2023 pelo Grupo Gestor das Equipes Multidisciplinares (GGEM), do Tribunal de Justiça do Tocantins, mapeou a rede de atendimento à pessoa idosa em Palmas. Essa rede é composta por serviços públicos, privados e do terceiro setor, voltados à promoção e defesa dos direitos da população idosa.

O levantamento considera como “equipamentos” as estruturas ligadas à saúde, assistência social, segurança, educação, previdência, justiça e outros setores responsáveis pela garantia de direitos.

Ao todo, foram identificados 89 equipamentos voltados ao atendimento da população idosa na capital. A maioria está concentrada na área da saúde, com 40 estruturas. Em seguida vêm as organizações do terceiro setor — como ONGs, fundações e associações — com 15 equipamentos, e a assistência social, com 13.

O setor privado também marca presença, com 11 unidades. Já as áreas de defesa, segurança, justiça, educação e previdência social apresentam participação mais tímida, somando apenas 10 estruturas: três na defesa, duas na segurança, duas na justiça, duas na educação e uma na previdência social.

A baixa presença de estruturas nas áreas de defesa, segurança, justiça e educação em Palmas — apenas nove equipamentos no total — revela uma lacuna na proteção integral da população idosa. A escassez nesses setores pode comprometer o acesso à justiça, à segurança e à inclusão social, além de limitar ações de prevenção à violência e estímulo à participação ativa dos idosos.

Em entrevista ao Jornal Primeira Página, Luiz Sinésio Silva Neto, formado em Gerontologia e cientista do envelhecimento da Universidade da Maturidade (UMA), comentou sobre a rede de atendimento ao idoso em Palmas e como a cidade se estrutura para essa parte da população:

“Eu vejo que Palmas é uma cidade que vem se configurando como uma grande oportunidade para que as pessoas possam envelhecer com qualidade de vida. Se bem organizada, pode ser uma cidade de atração e referência para quem quer envelhecer no mundo todo. Temos sol, uma cidade plana, serra, lago, temos unidades de saúde disponíveis. Todavia, existem várias ‘Palmas dentro de Palmas’, e, quando ampliamos o olhar nesse aspecto, temos muito trabalho a fazer, principalmente com os idosos de menor renda, que são provedores do lar e ainda têm a violência presente em seu lar, seja psicológica ou financeira. Existem diferentes retratos de envelhecer aqui na cidade.”

Luiz Sinésio Silva Neto
Luiz Neto é cientista do envelhecimento da Universidade da Maturidade (UMA)

Para o cientista do envelhecimento, um determinante essencial para a qualidade de vida da terceira idade é a educação: “A educação para a pessoa idosa é uma estratégia essencial para ter dignidade e qualidade de vida, inclusive para o conhecimento de seus próprios direitos. Também nessa perspectiva, existem diversas facetas de Palmas quando se olha para a integração dos serviços para a terceira idade e a necessidade de ter maior articulação em áreas importantes: saúde, assistência social, cultura, lazer, mobilidade e relações sociais.”

Ainda nesta semana, o Jornal Primeira Página irá abordar sobre a falta das Instituições de Longa Permanência para Idosos (ILPIs) de caráter público em Palmas, que dispõe somente de unidades privadas e de alto custo para população idosa de baixa reda.

Iniciativas que fazem a diferença

Com o objetivo de compreender o processo de envelhecimento humano e contribuir para uma velhice ativa e digna, nasceu a Universidade da Maturidade (UMA), um programa de extensão da Universidade Federal do Tocantins (UFT), criado em 2006 e que hoje acumula mais de cinco mil alunos formados. A UMA está presente em oito cidades do estado, além de atuar na Bahia, no Mato Grosso do Sul e com um projeto recente para alcançar Portugal, na Europa.

A UMA se firmou como um espaço de convivência, aprendizagem e valorização da trajetória de vida das pessoas idosas, promovendo o encontro entre gerações. Além de ampliar o acesso a novos conhecimentos, o programa estimula o envelhecimento saudável, a autonomia e a cidadania ativa dos participantes.

Railda Divina dos Santos, 74 anos, é uma das personagens desta série especial do Jornal Primeira Página sobre a população idosa de Palmas. Aposentada e membra ativa da UMA, ela comentou sobre sua participação no programa e destacou a falta de um espaço público para acolhimento de idosos:

“No começo, a gente achava que ia ser muito difícil envelhecer aqui. Mas aí começaram a surgir coisas que ajudaram bastante. A primeira foi o SESC, que foi construído pensando nos idosos e já trouxe uma melhora. Depois vieram outras iniciativas, como a própria UMA, e isso foi dando uma vida melhor pra gente. Estou na universidade desde 2014, e graças a Deus foi muito bom para mim. Foi em uma época em que eu estava com muita dificuldade, e lá eu me encontrei. Não pretendo sair”, falou.

Luiz Sinésio Silva Neto reafirmou o processo educacional para a terceira idade como fator primordial: “Observamos o quanto é determinante e essencial para se viver com qualidade a formação educacional. A educação para a pessoa idosa é uma estratégia essencial para ter dignidade e qualidade de vida, inclusive sobre o conhecimento de seus direitos, evitando o crescimento dos casos de violência contra a terceira idade.”

Universidade da Maturidade em Palmas funciona no campus da UFT e foi fundada em 2006 – Foto Divulgação
Universidade da Maturidade em Palmas funciona no campus da UFT e foi fundada em 2006 – Foto Divulgação

Violência contra idosos

A violência contra a pessoa idosa segue como um problema persistente em Palmas. Entre 2018 e 2022, o estudo realizado pelo Tribunal de Justiça do Tocantins registrou 8.494 ocorrências de violência contra a terceira idade na capital, somando registros policiais e processos judiciais.

Já o Disque 100, serviço nacional de denúncias de violações de direitos humanos vinculado ao Ministério dos Direitos Humanos, recebeu 265 denúncias nos três primeiros meses de 2025 em Palmas, conforme levantamento do Jornal Primeira Página. Isso equivale a quase três registros diários de violência contra a pessoa idosa. Em 66,7% dos casos, o agressor foi o(a) próprio(a) filho(a).

As formas de violência mais comuns incluem agressões físicas, psicológicas, sexuais, financeiras, abandono, negligência, autonegligência, violência institucional e discriminação. Cada uma dessas modalidades representa uma violação de direitos e pode ter impacto direto na saúde, autonomia e dignidade da pessoa idosa.

O cientista do envelhecimento, Luiz Sinésio Silva Neto, comentou sobre a violência sofrida pela população idosa em Palmas: “É um dado que vem nos preocupando. Tem duas dimensões importantes. A primeira refere-se a uma rede de proteção e cuidado da pessoa idosa que deve ser mais robusta, articulada entre os diferentes pontos focais. Hoje, ela é frágil e dá essa sensação de impunidade contra o agressor.”

Sinésio exemplificou com um caso concreto que aconteceu em Palmas recentemente: “Uma senhora que sofreu violência financeira da filha, que pegou o dinheiro da aposentadoria da mãe e apostou em jogos online.”

Quanto à segunda dimensão mais importante nesse cenário, Sinésio destacou a ampliação de programas de educação intergeracional: “Uma das estratégias que mais defendemos são os programas de educação intergeracional, onde criamos possibilidades de idosos e jovens conviverem juntos em programas educacionais, em que cada um aprende com o outro, mediados pelo afeto e gerando solidariedade geracional.”