OPINIÃO: amigos do seu Osmar e o desdém da lei no Tocantins

Governador, coronel da PM e deputados estão entre os amigos do influenciador investigado pela polícia

Quando os bordões “o resto é comigo” e “ta no grale” começaram a ser usados na internet pelo seu Osmar, personagem do influenciador digital e músico tocantinense Evoney Fernandes, o Brasil passou a conhecer mais esse sujeito caricato, com sotaque da nossa gente e famoso pelas mentiras espalhafatosas do malandro que interpreta no mundo digital.

Nos vídeos que compartilha em suas redes sociais (somente no Instagram são 4,5 milhões de seguidores), Evoney e sua turma fazem humor popular, ganham muito engajamento com piadas e brincadeiras e promovem rifas com sorteio de prêmios variados.

Mas foram justamente essas rifas, consideradas ilegais, que levaram a Polícia Civil do Tocantins a deflagrar em abril deste ano a operação “Ta no Grale”. A turma do Evoney, segundo a Secretaria de Segurança Pública, foi responsável por movimentar mais de R$ 4,5 milhões em menos um de ano com rifas de veículos, como carros e motos, celulares e outros prêmios.

Duas semanas depois desta operação, algo no mínimo estranho aconteceu. Evoney postou um vídeo na internet jogando sinuca e fazendo piadas com ninguém menos que o governador do Estado do Tocantins, Wanderlei Barbosa (Republicanos). Nos bastidores da polícia civil, a atitude do chefe do Executivo não foi bem recebida.

No vídeo ao lado do governador, Evoney ainda debochou da operação que apreendeu veículos de luxo avaliados em R$ 790 mil e mais R$ 635 mil em contas bancárias, totalizando R$ 1,42 milhão. “Sem chororô, viu governador Wanderlei. Eu não ia nem levar esses carros não, mas na semana passada aconteceu um negócio chato lá em casa e eu estou precisando de carro”, falou.

Irmão quer ser candidato

Desde então, os amigos do seu Osmar foram aumentando. Natural de São Bento do Tocantins, Evoney segue próximo de figuras importantes da política tocantinense, de forma direta e indireta. Pelo visto, algo na sua personalidade (que se mistura com o personagem Seu Osmar) o fez cair nas graças das autoridades.

Em outubro deste ano, por exemplo, seu irmão Ernandes Fernandes foi responsável pela realização da copa de futebol “Ta no Grale” [de mesmo nome da operação policial]. O evento, que movimentou a região do Bico do Papagaio, recebeu R$ 150 mil da Secretaria Estadual de Turismo com dispensa de licitação para contratação de um show artístico de encerramento.

A copa, além de promover o esporte na região com 14 equipes participantes, também foi recebida como uma ação de pré-candidatura do seu irmão Ernandes Fernandes, que deve anunciar sua intenção pela prefeitura de São Bento. Brindes foram distribuídos para os participantes da copa de futebol.

O governador Wanderlei Barbosa, que estava de passagem pela região norte do estado, prestigiou o evento, assim como o presidente da Assembleia Legislativa do Tocantins, deputado Amélio Cayres (Republicanos), uma das principais lideranças políticas desta região.

Evoney segue então passeando pelas instituições tocantinenses. A última ocorreu nesta segunda-feira, 20 de novembro, quando surgiu em um vídeo publicado na internet ao lado do Comandante Geral da Polícia Militar do Tocantins, Coronel Márcio Antônio Barbosa. O deputado estadual Leo Barbosa (filho do governador) também estava presente.

A postagem foi realizada durante almoço com “arroz e pequi” na sede do Batalhão de Choque em Palmas e foi compartilhada na conta oficial da PM no Instagram. Nas palavras do coronel Barbosa, Evoney é um “tocantinense raiz que orgulha nosso estado com seu trabalho, sua música e seu humor”.

Assim, o “ta no grale” segue formando amizades e mais amizades. Enquanto isso, o Ministério Público do Tocantins já apresentou denúncia contra Evoney e sua turma, composta por Hitalon Bastos e Fábio Neto (ambos aparecem em várias postagens ao lado do influenciador).

Conforme investigações da polícia, entre maio de 2022 e fevereiro de 2023, foram mais de 30 rifas sem autorização do Ministério da Economia. O juiz Rafael Gonçalves de Paula, da 3ª Vara Criminal de Palmas, aceitou a denúncia em junho. O trio poderá responder por loteria não autorizada, lavagem ou ocultação de bens, direitos ou valores oriundos de corrupção e crimes contra a economia popular.

O resto é com eles.