Do diagnóstico à sala de aula; câncer em pets preocupa veterinários e mobiliza ações de conscientização em Palmas

O câncer é uma das doenças que mais afetam cães e gatos em todo o mundo. De acordo com a Organização Mundial da Saúde Animal (WOAH) e o Conselho Federal de Medicina Veterinária (CFMV), um em cada quatro cães desenvolverá algum tipo de tumor ao longo da vida, e cerca de 45% dos cães com mais de dez anos terão algum diagnóstico relacionado à doença.

Entre as fêmeas, os tumores de mama correspondem a mais da metade dos casos registrados, segundo a Associação Brasileira de Oncologia Veterinária (ABROVET). A entidade também aponta que o número de diagnósticos vem crescendo no país à medida que os animais vivem mais e têm maior acesso a cuidados de saúde, um reflexo direto do aumento da expectativa de vida dos pets.

No Brasil, clínicas veterinárias e universidades têm ampliado o debate sobre a prevenção e o diagnóstico precoce da doença. Em Palmas, o tema tem ganhado espaço nas salas de aula e nas atividades da Liga Acadêmica de Pequenos Animais (LAPA), vinculada ao curso de Medicina Veterinária do Centro Universitário Luterano de Palmas (Ceulp/Ulbra). O grupo realiza ações de extensão, estudos clínicos e reuniões científicas voltadas à conscientização e à educação dos tutores.

Formação e rotina clínica

De acordo com o professor Dayverson de Souza dos Santos, orientador da LAPA e docente do curso, os tumores de mama são os mais comuns observados na rotina clínica, seguidos pelos de pele, como melanomas e carcinomas.

“O que mais observamos nos atendimentos são os tumores de mama. Eles aparecem com frequência porque muitas cadelas ainda recebem medicações para evitar o cio e a gestação, e o uso prolongado desses hormônios aumenta o risco da doença”, explica o professor.

Professor Dayverson de Souza dos Santos, orientador da LAPA e docente do curso – Foto: Arquivo pessoal.

As atividades da Liga acontecem no hospital veterinário da universidade, onde os estudantes acompanham casos clínicos, discutem artigos científicos e participam de ações educativas abertas ao público.

As alunas Raissa Maklin, Rhayla Alves e Ananda Almeida, integrantes da Liga, destacam que a prática aproxima os futuros veterinários da realidade profissional. “Durante as cirurgias e os atendimentos, aprendemos a identificar sinais precoces e a orientar os tutores. Essa vivência nos prepara para enfrentar situações complexas na rotina clínica”, afirmam.

Alunas Raissa Maklin, Rhayla Alves e Ananda Almeida, integrantes da Liga – Foto: Arquivo Pessoal.

Dificuldades e avanços da oncologia veterinária

O professor Dayverson explica que o hospital da instituição já acumula uma boa casuística de casos, mas ainda enfrenta desafios estruturais para transformar os dados em pesquisa científica.

“Nosso sistema de registros não permite busca direta por diagnósticos, o que dificulta estudos mais amplos. A direção já trabalha para corrigir isso, e a ideia é começar um levantamento retrospectivo sobre os tipos de câncer mais atendidos”, comenta.

Além da questão técnica, o professor aponta a limitação de medicamentos específicos e o alto custo de terapias avançadas, como a radioterapia, ainda inacessível em grande parte do país.

“A medicina veterinária caminha atrás da humana em termos de tecnologia e recursos. Dependemos de adaptações e de investimentos em pesquisa. Isso afeta tanto a capacidade de tratamento quanto a formação dos futuros profissionais”, diz.

Outro obstáculo é a falta de conscientização dos tutores, que muitas vezes só procuram atendimento quando o animal já está em estágio avançado da doença. “Campanhas educativas e o diálogo entre universidades e comunidade são essenciais para mudar essa realidade”, acrescenta o docente.

Diagnóstico e cuidados preventivos

O diagnóstico precoce é apontado pelos especialistas como a principal forma de garantir tratamento eficaz. Em cães e gatos, a detecção é feita principalmente por palpação das glândulas mamárias e da pele, complementada por exames citológicos e biópsias.

“O tutor pode perceber pequenos caroços ou secreções e deve procurar um veterinário o quanto antes. O profissional fará a palpação e, se houver suspeita, coleta uma amostra para análise. Quanto antes o tumor é identificado, maiores são as chances de sucesso no tratamento”, explica Dayverson.

O professor lembra ainda que a castração é uma medida preventiva eficaz, pois reduz o risco de tumores de mama em fêmeas e de próstata em machos. “É um cuidado simples, mas que faz uma diferença enorme na saúde dos animais”, reforça.

As atividades da Liga acontecem no hospital veterinário da universidade, onde os estudantes acompanham casos clínicos – Foto: Morgana Gurgel.

Políticas públicas e prevenção em Palmas

A Prefeitura de Palmas, por meio da Secretaria Municipal de Proteção e Bem-Estar Animal (Sebem), informou que ainda não há um relatório consolidado sobre casos de câncer em cães e gatos atendidos em programas municipais.

A pasta, criada recentemente, destacou que ainda está estruturando suas ações e ampliando os serviços de atendimento veterinário. Não há, por enquanto, um serviço público específico para tratamento oncológico, mas a Sebem tem investido em campanhas de conscientização sobre guarda responsável e castração.

“A Prefeitura de Palmas reitera seu compromisso com o bem-estar dos animais e segue desenvolvendo políticas públicas voltadas à proteção, prevenção e educação, buscando parcerias para ampliar os cuidados veterinários oferecidos à população”, informou o órgão.

Saúde única e pesquisa compartilhada

Além do impacto direto na saúde dos pets, a oncologia veterinária também tem contribuído para avanços científicos que beneficiam os humanos. Segundo o professor Dayverson, alguns tipos de câncer apresentam comportamento semelhante em pessoas e animais, como o sarcoma ósseo e o câncer de pele.

“Essas semelhanças permitem que os cães sejam usados como modelos de estudo, ajudando a entender melhor a evolução e o tratamento da doença. É um exemplo claro de como a saúde animal, humana e ambiental estão conectadas dentro do conceito de Saúde Única”, explica.