A fotógrafa e artista visual tocantinense Angel Lima é uma das representantes brasileiras na 19ª edição do Noviembre Fotográfico, principal festival dedicado à fotografia contemporânea em Cuba. O evento ocorre ao longo de novembro, em Havana, reunindo artistas de 16 países. Angel participa da mostra coletiva “Sigue buscando en lugares donde no hay nada”, na galeria Habana Espacios Creativos, com abertura no dia 4 de novembro.
Em entrevista ao Jornal Primeira Página, a artista explicou como surgiu a seleção, detalhou aspectos do novo trabalho e refletiu sobre temas que atravessam sua produção — como Cerrado, ancestralidades afro-indígenas e questões de gênero — além de comentar seus próximos passos na pesquisa e na arte.
Seleção internacional e trajetória
Angel afirma que não recebeu um convite direto: a participação ocorreu após aprovação em convocatória aberta da Fototeca de Cuba. “Estar em um evento internacional desse porte é um reconhecimento importante e uma oportunidade de ampliar diálogos”, disse. Para ela, a participação tem peso artístico e acadêmico. “Fortalece meu olhar como pesquisadora em comunicação e fotografia”, afirmou.
Jornalista, fotógrafa e mestranda do PPGCom/UFT, Angel acumula passagens por redações, projetos culturais e pesquisas sobre imagem, território e memória. Em 2025, lançou seu primeiro livro fotopoético, Fotolíricas do Cerrado. Esta é sua segunda participação internacional — a primeira ocorreu em Buenos Aires, na mostra Luz del Fuego, em 2021.
A série e o conceito de “ver” o que parece vazio
A série apresentada em Havana, “Invisibilidades visíveis”, nasceu a partir do tema curatorial do festival e investiga superfícies, fragmentos e marcas do tempo. Angel explica que o mote a provocou a observar lugares aparentemente vazios.
“O fio condutor é essa ideia de que paisagens ‘sem nada’ guardam camadas de memória e sentido para quem se dispõe a observar”, disse.
A artista utiliza luz natural e intervenções artesanais de luz para criar atmosferas que revelam texturas e pequenas presenças. “A luz conduz toda a narrativa visual. As intervenções manuais criam deslocamentos que chamam atenção para detalhes que poderiam passar ocultos”, afirmou.
Influências e transformações estéticas
Angel cita o Cerrado, as culturas afro-indígenas e debates de gênero como influências recorrentes — mesmo quando não aparecem explicitamente. “Do Cerrado, herdei a atenção ao detalhe. Das culturas afro-indígenas, a imagem como memória. E as questões de gênero me levam a valorizar gestos e potências sutis”, afirmou.
Segundo a artista, seu processo criativo mudou desde a participação na Argentina. “Meu trabalho se tornou mais aberto ao experimental. Hoje permito que a fotografia se expanda para o abstrato e para outras linguagens da luz”, disse. Ela afirma que também passou a compreender território como dimensão afetiva e política, não apenas geográfica.
Próximos passos
Após o festival, Angel segue pesquisando fotografia indígena — tanto a produzida pelos próprios povos quanto imagens feitas sobre eles — e desenvolvendo projetos ligados ao Norte brasileiro. “Acredito na importância de nos representarmos enquanto território. Mas também busco que essas narrativas dialoguem com pessoas de outros lugares”, afirmou.
A fotógrafa antecipa que novos trabalhos já estão em desenvolvimento. “Tenho projetos que continuam investigando temas regionais. São pautas que me acompanham e sigo aprofundando nos próximos trabalhos”, completou.